sexta-feira, 5 de julho de 2013

Wäls quer aumentar produção em 30 vezes com nova fábrica, que fica pronta em 2015

José Felipe Carneiro discursa, na assinatura do acordo. Foto: Prefeitura de Araxá

Anunciada no último dia 10 de junho, a nova fábrica da mineiríssima Wäls na cidade histórica de Araxá (MG) deverá ficar pronta no primeiro semestre de 2015, revela o mestre cervejeiro José Felipe Carneiro, em entrevista ao 700 Cervejas. O investimento é estimado, inicialmente, em R$ 20 milhões. Apostando forte na expansão do setor de cervejas, a Wäls pretende produzir na nova unidade, de 22 mil metros quadrados, até 1 milhão de litros por mês – mais de 30 vezes a produção atual, de 30 mil litros por mês. Não existem estatísticas precisas sobre a produção das cervejarias artesanais brasileiras  já que, segundo os próprios órgãos públicos responsáveis pela fiscalização do setor, não há discriminação da forma de produção, se industrial ou artesanal , mas o volume anual de 12 milhões de litros certamente colocará a Wäls como a "maior microcervejaria" do país.

— As obras começam agora no segundo semestre (possivelmente em julho, segundo o Diário de Araxá). Elas devem se prolongar por um ano e meio — explica José Felipe, responsável pela produção de delícias de inspiração tradicionalista como a dubbel, a tripel e a quadrupel, e de produtos mais ousados como as recentes 42 e Saison de Caipira, que têm por base o estilo farmhouse.

O investimento será bancado em parte pelo caixa da empresa, e parte por um financiamento do Banco de Desenvolvimento do Estado de Minas Gerais (BDMG). José Felipe não detalha os valores, mas, segundo o site da instituição, os financiamentos para capital de giro e expansão dos negócios de micro e pequenas empresas, com faturamento de até R$ 30 milhões por ano, tem limite de R$ 4 milhões. Podem ser usados para "compra de matéria prima, reformas, capital de giro, obras civis, veículos", com taxas de juros a partir de 0,85% ao mês, prazo de carência e até quatro anos para pagar.

Na escolha da cidade, pesaram não só argumentos econômicos, mas também sentimentais:

Os fatores determinantes (para a escolha) foram o alto potencial econômico da cidade, o valor turístico de alta relevância em Minas Gerais, e o fato de nossa família ser de Araxá — diz.

Essa vinda para Araxá, pessoalmente, é um presente muito grande para a minha alma, depois de estar fora por 40 anos e poder retornar com a nossa expertise junto com a cervejaria e para participar da Cidade Gastronômica. Nós tivemos diversos convites de cidades tradicionalmente conhecidas em cervejaria, mas a nossa alma está aqui — disse o pai de José Felipe, Miguel, ao semanário local Clarim.

José Felipe conta que começou a negociar o empreendimento com a prefeitura, administrada pelo médico Jeová Moreira da Costa, conhecido como Dr. Jeová (PDT), em 2012. No mês passado, ele assinou o protocolo de intenções com a prefeitura para inclusão da cervejaria no projeto da Cidade Gastronômica, que até então contava o Clube da Cozinha Araxaense. Dr. Jeová contou ao jornal local que se interessou pela ideia de incluir uma cervejaria durante uma viagem a Campos do Jordão em 2010. Ficou maravilhado em ver a cervejaria local (Baden Baden) como atraía visitantes.

A intenção do prefeito, obviamente, é revitalizar a atividade econômica da cidade e aumentar a presença dos turistas, que trazem... sim, dinheiro, aquecem a economia local, em tempos bicudos como os que vivemos. A cidade, de cerca de 100 mil habitantes, fica no Sudoeste de Minas Gerais, na área do Triângulo Mineiro-Alto Parnaíba. É conhecida pelo artesanato e pelas águas medicinais da estância hidromineral. Sua economia, na parte industrial, é dominada pela produção de fosfatados (fertilizantes) da Vale, e pela mina de nióbio  o metal preferido do saudoso Dr. Enéas  explorada pela Companhia Brasileira de Mineração e Metalurgia (CBMM). Um charme gastronômico não cai nada mal.

Também sem entrar em detalhes, José Felipe diz que a maior escala deverá trazer reflexos positivos para o custo dos produtos aos consumidores.

— A intenção é ter condições melhores de preços para o consumidor final, com a mesma qualidade de sempre.

Quanto a intenções futuras de aceitar sócios ou de vender a cervejaria, é enfaticamente vago:

— A família (Pedras Carneiro) pretende continuar sendo a única proprietária da cervejaria.


ANÁLISE: MOMENTO DECISIVO 
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Todo investimento tem seus riscos. Todo mundo que já comprou algo parcelado sabe o quanto ter prestações a pagar adiciona tensão a um investimento. E R$ 20 milhões não são R$ 20, nem R$ 200. São dez zeros. É zero pra cacete, e por mais que se tenha segurança na qualidade do produto, exige uma dose grande de coragem. Quem não arrisca... não é o que diz o ditado?

Depois de encontrar as primeiras garrafas no Empório Icaraí, em abril de 2011, e me impressionar com o resultado das degustações, passei a acompanhar a trajetória da Wäls  Em agosto, tive a oportunidade de bater papo com o irmão de José Felipe, Tiago, no estande da empresa no Beer Experience, em São Paulo. Chamou a atenção o carinho com que ele falava do processo de produção, e com a atenção aos tempos adequados para cada etapa.

A Wäls tem produtos de qualidade para que tudo dê certo. De toda a sua linha, é difícil pensar em uma que não tenha sido premiada em concursos. Além do "trio parada dura"  dubbel, tripel e quadrupel , a Witte, witbier, se destaca, juntamente com a pilsen e a champenoise Brut. Ao que tudo indica, animada com a ampla aceitação e o reconhecimento de suas criações, a cervejaria partiu para o tudo ou nada. Se tudo der certo, a cervejaria transforma o reconhecimento qualitativo em quantitativo. Pode torná-la algo semelhante ao fenômeno da Devassa, em seu início. Não custa lembrar, é de uma família do ramo de bares e lanchonetes, e possui um bar, o Stadt Jever. Se não de certo, o "pretende" da última frase deixa uma saudável porta aberta...

Para dar o salto com segurança e chegar do outro lado, marketing e a publicidade carecem de atenção. O slogan é marrento, como se diz aqui no Rio, mas como suas cervejas têm angariado prêmios e toneladas de elogios, a autoconfiança é saudável. Tiveram a boa ideia de homenagear a resposta do humorista britânico Douglas Adams para a resposta fundamental da humanidade e criar a 42, mas patinaram na escolha do estilo, saison/farmhouse. A cerveja, que leva uma combinação bastante inusitada de adjuntos (limão e café), ficou excelente. Mas a cervejaria podia ter explorado de fato o rico universo do Guia do Mochileiro das Galáxias  da mesma maneira que diversas cervejarias americanas vêm baseando suas criações na cultura literária, televisiva e cinematográfica  e trabalhado mais a fundo o conceito. É o que as cervejarias americanas, principalmente, têm feito com a cultura contemporânea.

Atrair Garrett Oliver para uma produção colaborativa foi uma conquista significativa. O "embaixador cervejeiro" da Brooklyn Brewery havia comentado, em entrevista ao 700Cervejas em abril do ano passado, que queria provar "cervejas com gosto de Brasil" e mencionou a cana de açúcar como possibilidade. Um mês depois, a red ale Uacari, da Cervejaria Nacional, de São Paulo, apareceu no Untappd. Em novembro, Garrett foi cortar cana, numa típica mas emocionante "photo-op" muito bem aproveitada na brassagem, transformada em evento. Mas a Saison de Caipira tem aparecido nos noticiários não especializados  e até em alguns especializados  como a primeira no Brasil a usar cana de açúcar na receita.

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