sexta-feira, 23 de setembro de 2011

EXCLUSIVO - Punks, piratas e a
revolução da cerveja artesanal

James Watt e Alan Martin Dickie tinham 24 anos quando decidiram fundar a BrewDog "na garagem de casa", em 2007. James se intitulou "chefe das coisas (chief of stuff, trocadilho com chief of staff, chefe da equipe) e Martin passou a ser o "pirata cervejeiro" (beer pirate). Quatro anos depois, a empresa é a segunda maior cervejaria independente da Escócia e continua crescendo e inventando cervejas cada vez mais impressionantes.

Ao longo deste período, eles já deram muito o que falar - para saber mais, a visita ao blog dos caras é obrigatória. São radicais. Estão em guerra contra as grandes indústrias cervejeiras e suas pilsners sem gosto e sem personalidade e em busca de aliados para a revolução da cerveja artesanal. Nesta entrevista, a primeira a um jornalista brasileiro (coisa que você só vê aqui no 700Cervejas), o fundador da empresa, James Watt, explica os ideais da cervejaria mais punk do mundo e, de quebra, revela qual é a cervejaria brasileira favorita deles!



BATE-PAPO JAMES WATT // FUNDADOR DA BREW DOG


Vocês chamam a cervejaria de "libertina" e dizem que seus bares oferecem um lugar para os clientes "escaparem da patética monotonia do mercado de massa de cervejas industriais feitas por corporações sem rosto". Seu objetivo declarado é "redefinir completamente a cultura de beber cerveja no Reino Unido. O anúncio da Punk IPA mostra a garrafa dela sobre um monte de garrafas estilhaçadas de cervejas de massa. Acho que podemos dizer que a sua cervejaria tem uma agenda política em relação às grandes indústrias cervejeiras, não?

O ethos punk é inerentemente político e é um estado mental que complementa perfeitamente tudo aquilo que a BrewDog defende. Bebedores de cerveja ficaram cheios das brown ales. O que faz a BrewDog diferente é que nós pensamos sobre cada aspecto do processo, que inclui não apenas a produção da cerveja, mas também a embalagem e como nós educamos as pessoas a respeito. No que é essencialmente um vácuo nas cervejas artesanais, a ideia de dois caras escoceses e um cachorro aparecendo vestidos de pinguins e fazendo a cerveja mais forte ou mesmo embalando sua cerveja num esquilo empalhado é completamente diferente de tudo que as grandes cervejarias defendem. E é por isso que o que fazemos é tão refrescante e tem feito com que as pessoas queiram ajudar nossa cervejaria a crescer.

Como você descreve esta "ética punk rock" aplicada à cultura cervejeira?

Para nós, punk rock tem muito a ver com assumir riscos, remar contra a maré e em geral ter colhões pra fazer o que você quer sem a ameaça ou a preocupação com a consequência se pendurando em você. Quando se trata de aplicar isso à cultura cervejeira, a Brew Dog faz cervejas que expandem os limites, que expandem as convenções, e fazem isso apesar do que as pessoas digam ou pense sobre elas. Existe também uma forte cultura "faça-você-mesmo" que corre pelo punk - seja a música punk rock, a moda ou outra - não dá para ser mais punk que dois caras começando uma cervejaria na própria garagem!

A ideia da "revolução da cerveja artesanal" é poderosa, mas as outras cervejarias compartilham este pensamento ou vocês terão que fazer a revolução por conta própria?

Infelizmente, o número de cervejarias que estão ligadas e são parte da revolução da cerveja artesanal é atualmente sobrepujada pelo número de cervejarias que não são parte da revolução. Não significa dizer que as coisas não podem mudar, no entanto. Há, definitivamente uma crescente maré de cervejarias artesanais, tanto dentro do Reino Unido quanto globalmente. Mais ainda, à medida que números cada vez maiores de pessoas vão se educando e se tornando envolvidas com as cervejas artesanais, a demanda e o interesse nas cervejas que são feitas com paixão e integridade podem apenas continuar a crescer aceleradamente, o que, por sua vez, criará oportunidades para mais pessoas de juntarem à essa revolução.

The End of History foi uma cerveja vendida por 500 libras, se li corretamente, e vi aqui no Brasil uma Sink the Bismark na promoção sendo vendida por R$ 400 (cerca de US$ 250). Isto as torna um tanto inacessíveis para várias pessoas, suponho, não apenas para mim... isso não vai um pouco contra a ideia toda de revolução punk?

O caso da The End of History foi especial, uma vez que foi uma edição estritamente limitada - apenas 7 foram feitas - e também foi um pedaço de arte; o custo era principalmente devido ao valor da taxidermia de alta qualidade. Estamos conscientes de fazer nossas cervejas tão acessíveis quanto possível e o preço é um fator dentro disso. A BrewDog produz uma ampla gama de cervejas diferentes e com isto vêm diferentes etiquetas de preço também. No geral, nossas cervejas são vendidas no preço médio do mercado, apesar de acreditarmos que são na verdade mais valiosas pelo preço, dado que estão cheias de paixão e ingredientes de alta qualidade - não os produtos químicos e substitutos baratos, como nas cervejas regulares do mainstream.


Vocês mencionam no site que houve problemas para levantar empréstimos com os bancos, etc. O IPO online foi mais uma declaração política ou mais uma necessidade econômica?

O IPO Liquidez (Equity) para Punks foi forjado de uma necessidade econômica, de levantar fundos para que pudéssemos expandir nosso negócio e as capacidades de nossa cervejaria, mas ao fazê-lo, tivemos uma amostra de uma declaração política também. A BrewDog foi a primeira cervejaria na Europa a obter liquidez desta maneira e não demorou até que nós estivéssemos nos mexendo nas comunidades cervejeiras e financeiras em igual medida. Ainda que Liquidez para Punks não garanta imensos ganhos financeiros, há várias outras razões para se envolver; um desconto vitalício na nossa cerveja é um dos benefícios!

Três anos atrás, em setembro, vocês venderam 100 mil libras, e agora estão se encaminhando para seis vezes esse número, um total de 6,5 milhões no ano. O dobro do que foi em 2010, que também foi o dobro do resultado de 2009. Quais são as perspectivas tanto para a produção quanto para o lucro em 2012?

A BrewDog já ultrapassou as metas que fixamos para 2011, então vamos esperar um pouco mais até que comecemos a estabelecer as metas ou fazer previsões para o ano que vem. Mesmo sendo quem está com a mão no leme, a taxa que a companhia continnua a crescer é impressionante para mim. Isto dito, nós também estamos mais ou menos trabalhando para dobrar nossa produção e nosso lucro ano a ano e agora isto parece totalmente factível para 2012.


Os bares de Camden e Manchester foram inaugurados?

Nossos bares em Camden e Manchester ainda são obras em progresso. Nossa abertura mais recente foi em Glasgow, e agora estamos continuamente na caçada por novos lugares por todo o Reino Unido, talvez o resto da Europa ou os States!

Quantas cervejas vocês precisam para surgir um bom nome para a cerveja?

Em relação ao batismo das cervejas, é um processo bastante orgânico. Às vezes, nós temos o nome nas nossas mentes até antes de termos começado a produzir a cerveja. Outras vezes, é aquele "momento Eureka" às 3h da manhã, quando você está esvaziando o tanque do mosto e de repente vem pra você o nome. No momento, nós estamos justamente no processo de nomear uma nova cerveja, mas - ao contrário das vezes passadas - nós colocamos três opções para os leitores do nosso blog votarem. Em última análise, acreditamos que um bom nome de cerveja deve seguir o coração, a alma ou a história da cerveja.

Como está o projeto da nova cervejaria? Por que ele será "hardcore eco"?

Nosso projeto da nova cervejaria fará com que a BrewDog seja dona da única eco-cervejaria autossuficiente do Reino Unido. Isto significa que nossa cervejaria terá impacto mínimo no ambiente, à medida em que usa vento e outras fontes renováveis de energia. Certamente, não é a maneira mais fácil de fazer cerveja, mas é um novo desafio e definitivamente algo que as grandes cervejarias de massa sequer considerariam.

Vocês se lembram da situação em que decidiram superar os "comedores de salsicha" com a cerveja mais forte do mundo?

Nós não decidimos conscientemente fazer a cerveja mais forte do mundo [Nota do editor: Não é o que diz o vídeo do blog deles] e, como a maioria das grandes ideia, meio que apenas aconteceu. Martin - co-fundador da BrewDog e mestre cervejeiro - vinha brincando com alguns métodos bem inovadores de congelar a cerveja e obter alto ABV como resultado. Dois pinguins e uma fábrica de sorvete depois, nasceu a Tactical Nuclear Penguin. O resto - como dizem - é história.

A propósito, vocês receberam alguma reação dos alemães por causa do "comedores de salsicha"? Eles arrumaram algum apelido para vocês?

Infelizmente, não sabemos de nenhum apelido. Estamos abertos a sugestões, no entanto!

E como vocês reagiram quando, após a Tactical Nuclear Penguin, eles aumentaram o ABV da Schörschbock?

De certa forma, ficamos devastados porque trabalhamos bastante na Tactical Nuclear Penguin, até hoje, ainda creio que é uma de nossas melhores cervejas. Como disse, não pensamos em fazer a TNP para ser a cerveja mais forte do mundo e ela ainda permanece uma cerveja artesanal realmente incrível. Quando a Schörschbock aumentou o ABV, nós já tínhamos começado a trabalhar na Sink the Bismarck!, então pareceu justo retaliar e mostrar aos alemães do que nós somos feitos.

Quem surgiu com a citação de Francis Fukuyama?

Eu trouxe a citação de Francis Fukuyama, porque pareceu o paralelo perfeito para o que estávamos tentando alcançar.

Por favor, explica aquela garrafa… todo mundo a quem mostro a foto fica horrorizado.

A BrewDog não força as convenções apenas em relação à cerveja, mas em toda a experiência. Da mesma maneira que as pessoas estão condicionadas a beber lagers amarelas borbulhantes do mesmo nível de 4% a 5% ABV, as pessoas também esperam que sua cerveja seja servida em uma garrafa, um copo ou uma lata. Os esquilos que abrigam The End of History convidam os consumidores a questionar como eles pensam que a cerveja deveria ser servida, e a ampliar seus horizontes a infinitas possibilidades. Talvez eu também devesse acrescentar que os animais morreram de causas naturais e não se entregaram como sacrifício à causa da cerveja artesanal... nossos estudos mostram que os esquilos não são grandes bebedores de cerveja artesanal.

O Brasil é um país ainda muito dominado pelas "cervejas corporativas sem rosto", mas com alguns piratas cervejeiros atuando. Vocês já beberam alguma cerveja brasileira? Se sim, vocês lembram qual foi e o que vocês acharam?

Para nós, uma das cervejarias artesanais brasileiras mais empolgantes é a Colorado. Além de uma grande variedade de porters e pilsners, é a abordagem da Colorado à cervejaria artesanal que realmente nos toca, especialmente quando o mercado é praticamente impenetrável graças a coisas como a InBev. A Colorado não deixou que isso os impedisse, no entanto, e o uso de ingredientes locais e naturais, como o açúcar da rapadura, uma grande variedade de lúpulos e uma variedade de ABVs os torna um grande exemplo de uma cervejaria artesanal pioneira lutando contra as dificuldades e vencendo.

4 comentários:

  1. Caramba! Fabulastica!
    Esse final me deixou com vontade de experimentar logo as colorados, a pesar de ter umas BrewDog's na geladeira...

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  2. Realmente, excelente esse final! HAHA
    Já tomei dois tipos de Colorado, muito bom!

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  3. Parabéns pela entrevista, as brejas brewdog são excelentes e realmente merecem destaque.
    Apenas uma observação, acho que a melhor tradução para equity é capital e não liquidez.
    Um abraço

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  4. Esses caras são contraditórios. Chamaria de neo punks, ou coisa do tipo, mas nunca punks.

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